Cansada de guerra.
O lugarejo “Piranhas” sempre foi o centro que acolheu os Batistas por muitos anos. Nesse lugar eles experimentaram bom inverno, que alavancava tudo. Havia fartura nesse aguardado período. Muitos pés de mangas, os mesmos acabaram morrendo cinquenta anos depois. Havia também goiabeira, oiticica, nos baixios, batata doce, muita cana-de-açúcar, que proporcionava a moagem para a produção de mel, rapadura e tiborna, a borra que formava uma espuma espessa, quase um mingau grosso, que saia do caldo de cana, enquanto o caldo fervia para dar o ponto de mel. Essa tiborna serve para alimentação dos porcos.
Outra coisa divertida era a debulha de feijão feita de forma coletiva, vários grupos de pessoas compareciam após a colheita, depois esses grupos se revezavam, cada noite em uma casa, em mutirão. Dali saia namoricos que se concretizavam com troca de olhares, piscadelas matreiras, tudo com muita algazarra.
A mobília desse pessoal, quando se casava, alguns moravam em casa de taipa, constava apenas de potes de barro, acima deles um quadradinho de madeira chamado de “copeira”, onde havia uns grampos que seguravam os copos de alumínio reluzente, uma cristaleira das mais simples, comprada na feira, junto com uma mesinha com quatro cadeiras. Alguns poucos casais possuíam camas, mas era raro, o que se via mais eram redes e lençóis de tecido de saco, outrora utilizado na embalagem de sessenta quilos de açúcar.
A mobília de minha tia Tereza não fora diferente, era composta por dois potes, seis pratos de metal esmaltados, seis colheres, seis xícaras, seis copos, alguidares (espécie de prato redondo, fundo, travessa, feito de barro) e panelas também de barro, uma pequena mesa e quatro “tamboretes”, assim chamados as cadeiras sem encosto com seus acentos de couro curtido. A famosa “cristaleira” dela fora feita por meu avô, que empilhou três caixotes de madeira, pregou-os, colocou quatro pés e estava pronta. Não possuíam cama, cada um trouxe para o novo lar a sua inseparável rede e seu cobertor.
Anos à frente seu filho mais velho, de posse de um legado de pobreza, seguia a mesma sina dos pais, porém, décadas depois os filhos desse filho tinham acesso ao que a modernidade oferecia e que estava ao alcance de qualquer pobre, mesmo assalariado, bem como os filhos mais novos de Tereza tinham seus próprios carros, inclusive poder aquisitivo para comprá-los “zero quilômetro”.
Contudo, Tereza passou maus bocados na vida. Ela conta que até os quinze anos de idade só se vestia com roupa feita de tecido de saco, e quando o dinheiro sobrava um pouquinho o pai comprava uma “peça” de tecido, às vezes vermelho intenso e todas se vestiam iguais.
A mãe dela, minha avó Lídia, era completamente alheia às necessidades dos filhos. A penúria era maior do que se fazia necessário.
O enxoval dos recém-nascidos não escapava à meia dúzia também: seis camisinhas de bebês, seis “coeiros”, que eram uns panos quadrados com um bordado na barra. Quando manchado dava muito trabalho, haja vista não terem conhecimento de sabão em pó. Compravam, para a criança, um sabonete com “saboneteira”, e mamadeira, geralmente de plástico barato, às vezes de vidro.
Toda essa gente dispunha de certo recurso proveniente da agricultura, das culturas colhidas, mas não as utilizava completamente a ponto de revender. O feijão, o milho, era guardado em compridos silos feitos de zinco, em formato de tubo, tampado em cima, mas com uma abertura em baixo, como se fosse um filtro, utilizado no consumo diário. Do milho se fazia o mungunzá, o feijão era o mais consumido, já o arroz era feito somente em ocasiões “solenes”.
Minha tia Tereza casou-se em 1952. Não era exceção, como todos os seus familiares também residia na “velha” Piranhas. Teve 11 filhos. Com nove meses de casada deu luz a seu primeiro filho, Jonas, apelidado de “Hominho”. Todos zoavam o casal, suspeitando que a mesma já se encontrava grávida quando contraiu núpcias. Tereza sempre achou que engravidara na primeira noite de “lua de mel”. Depois vieram os demais filhos: Elídia, Onésimo, que nasceu muito doente e dava muito trabalho, tirando-lhe a paz. Minha mãe, bem pequena, chegou a cuidar dele e nessa ocasião acabou provocando, sem querer, uma horrível queda de rede. Onésimo faleceu, tempos depois, mas não em decorrência da queda.
Certa vez um vizinho deu-lhe a notícia de que o filho de fulano de tal, que padecia de um mal na garganta, falecera, lembrando-se de seu sofrimento com Onésimo, e desejando alívio, Tereza falou sem pensar: “Algumas pessoas tem o prazer de ver que seu filho doente morreu, pondo fim ao sofrimento, só eu que não tenho esse prazer”.
Nasceu então Jezonita, seis meses depois morreria de diarreia e febre; veio Eridan, morreu anêmica, também com seis meses de idade; nasceu Silas, este sobreviveu, nasceu Edna, essa era o xodó de seu pai, Vicente Batista, morreu de dor de cabeça e febre com apenas três anos. A irmã mais velha a conduzia sentada no quadril, quando Edna escapuliu, caiu no chão e feriu a nuca, porém sarou. Tempos depois levou outra queda ao cair da rede. Foi então que passou a se queixar de forte dor de cabeça, morreu expelindo secreção purulenta pelos ouvidos, em grande quantidade. Essa morte abalou muito toda a família. Logo após veio Edson que era muito doente, com problemas de garganta e febre alta a ponto de ter convulsão.
Certa vez, pressentindo a morte de Edson, contou minha mãe, pois Tereza só lembrou-se desse fato tempos depois, colocou-o em seus braços, expondo-o a Deus clamou veementemente por sua vida, e Deus concedeu-lhe o desejo de seu coração, não imaginando ela o que o futuro lhe reservava a respeito desse filho. Anos depois, já adulto, Edson passaria o maior tempo de sua vida afetado por uma terrível depressão, às vezes com crises de agressividade, causando sérias dificuldades à velhice de sua mãe. Sendo mantido sob remédios "controlados" e vivendo de maneira isolada.
Nesse meio tempo minha tia achava que não criaria mais nenhum filho, e quando certa vez lavava a roupa, orou aos prantos pedindo perdão a Deus e dizendo-lhe saber que não criaria mais nenhum filho. Foi então que pode ouvir uma voz diferente que lhe falava ao coração: “Conforma-te mulher, pois ainda criarás filhos”!
Devido as muitas dificuldades como a falta de terras, inverno escasso, a família mudou-se de Sítio Piranhas para Sítio Milagres, em 1971. Lá moraram por sete anos. Nesse “Sítio”, ela sofreu um aborto espontâneo aos três meses de gravidez, em 1973. Algum tempo depois ela engravidou novamente e teve outra Edna, que infelizmente morreu também. Tereza tinha certeza que estava sendo castigada e prosseguia entre confissão, arrependimento e culpa. Cumprindo Deus o que lhe falara, nasceu Leliana e depois Helder, ambos sobreviveram, ficando no total com cinco filhos.
A família tinha seu sustento na agricultura, praticamente de subsistência, trabalhavam na terra de quem aparecesse com a melhor proposta, uma vez que a pequena terra deles, herança dos pais, havia sido distribuída entre os filhos e quase desaparecida após algumas vendas, havendo a necessidade de se trabalhar em terras estranhas. Felizmente, mudanças ocorreram para apagar as lembranças dolorosas deixadas para trás.
Devido a bondade do patrão, bem como o fato do mesmo ser um tanto abastado e também uma pessoa muito acessível, as coisas haviam mudado. Nesse sítio puderam criar alguns animais. Chegaram a adquirir mais de 20 cabeças de gado, além de galinha e porcos. O esposo de Tereza costumava dizer: “Eu já fui pobre; hoje sou muito rico”.
Aos domingos iam à feira em Almino Afonso. Estavam em situação razoavelmente boa nessa época, inclusive, havia bom inverno, na ocasião desse inverno o açude da localidade chegou a transbordar, os baixios encheram-se e tudo ao redor era verde. Os silos também foram cheios com feijão e milho, a moagem de cana seguia a todo vapor, foi um ano memorável.
Moraram também junto com a família “Gomes”, no “Sítio dos Gomes”.
Uma de minhas primas filha mais velha, então com 14 anos, ia sempre dormir com a proprietária da terra, solteirona, essa patroa vivia só. Minha prima odiava essa obrigação, mas os pais a coagiam. Costumava ir por volta das 17:00h.
Certa feita, logo cedo da noite, começou a chover. Chuva forte, com grandes trovoadas.
Nessa casa havia uma velha antena de rádio, parte dela ficava para fora, no telhado. Apesar de não terem mais o rádio, o receptor de ondas continuava lá.
Estavam sentadas na sala e decidiram recolher as latas que aparavam a água da chuva, pegaram as latas meias de água e levaram as mesmas para uma pequena despensa, tão logo entraram desceu, atraído pela antena, um raio, uma pequena faísca em “brasa”, que correu toda a casa, ela e a patroa agarraram-se e ficaram encolhidas no canto da despensa, a lamparina apagou e a iluminação era apenas da faísca que percorria a sala de forma enlouquecida, como se fosse espada de São João, muito conhecida no interior do nordeste, utilizada em diversão durante as festas juninas, como se fosse um pequeno foguete rastejando enquanto soltava faíscas pela cauda. Segundo minha prima, foi apavorante.
A faísca arrebentou alguns móveis, incendiou um colchão e derrubou parte de três paredes, entrando, por fim, no alicerce de outra, enterrando-se profundamente. Minha prima não sabe como ficaram vivas. Puro milagre.
Quando tudo se acalmou as duas mulheres saíram às escuras para apagar o fogo do colchão, enquanto tropeçavam em coisas soltas por toda parte, só aí tiveram noção do caos em que ficou a casa. Minha prima conta que ficou com o pelo do corpo “chamuscado”, ela própria exalava odor de cabelo queimado. As duas mulheres resolveram largar tudo e pedir arrego na vizinhança. Por lá dormiram.
No dia seguinte, ao contemplar os danos o susto foi pior. Todos vinham contemplar o estrago. Minha prima era sempre provocada:
- É verdade que você é à prova de meteorito? Brincavam.
Laura, a irmã de Tereza, já morava em Petrolina, e os parentes de ambas em Mossoró. As Piranhas já não comportava metade dos Batistas, e parte deles havia ido embora para Goiânia, no Goiás. Tereza sentia-se meio só, e tinha enorme vontade de, na linguagem dela, “viajar, conhecer o mundo, lugares”. Vivia se queixando de que todo mundo viajava, só não eles.
Aconteceu de seu cunhado, Antônio Batista, irmão de seu esposo, escrever para eles e os convidar para irem morar em Itaibó, no Estado da Bahia. E ele pintou um quadro fabuloso a respeito desse lugar. Logo trataram de vender tudo o que tinham, incluindo os animais, a velha e boa máquina de costura foi doada. Venderam outras coisas e o restante dos pertences coube unicamente em uma caixa de papelão, contendo apenas a pouca louça. Nas malas, as roupas, os lençóis e as redes. Dessas malas sobrou uma para contar história, que lembra vagamente um baú, hoje com um pouco mais de oitenta anos. “Herança” que a desejo.
Dentre os viajantes, Tereza foi a mais empolgada, entretanto, dias depois ela passou a dizer para o marido que essa mudança poderia não ser boa, e ela já estava vendo isso por meio de sonhos que havia tido.
Colocaram seus pertences em uma pick-up fretada e chegaram vinte e quatro horas depois.
Minha tia estava bem animada, achando que Itaibó ficava próximo de Petrolina, PE, onde morava sua irmã Laura. Ledo engano.
Em chegando lá ficaram pasmados! A primeira impressão foi péssima. Ao redor das casas havia muitos morros, com plantações morro acima, também se lavrava seguindo a elevação da terra. Fazia muito frio, tanto que os deixava encolhidos. Pela manhã havia sempre o espanto ao constatarem a pequena névoa.
O marido trabalhava no que pareciam ser as “serras”, ganhava pouquíssimo, junto com o filho mais velho. A sorte é que tinha certa quantia em dinheiro, fruto das vendas dos objetos na vinda.
Tereza simplesmente não gostou do lugar. O Candomblé era prática constante aos sábados e ela não entendia essa forma de religiosidade. No riacho, ao lavar roupa, as mulheres criticavam, jogando indiretas, quanto a não compreensão da religião delas. Constantemente Tereza desejava voltar.
Seus filhos mais velhos, “Hominho”, Elídia, junto com sua nora e os três netos voltaram com apenas um mês de estada. O motivo principal para a volta de Hominho é que o filho mais velho, deste, não se dera com o lugar e vivia com diarreia, vômito e febre. Sua nora levava o menino para as benzedeiras, enquanto minha tia insistia com Deus para que o curasse e implorava de joelhos ao pé da rede: “Deus, não deixe esse menino morrer aqui. Meu filho não suportaria”. Deus ouviu e providenciou o retorno deles. No ano de 2003 esse filho de “Hominho” seria assassinado a tiros, no Projeto Maniçoba, BA, o que abalou toda a família.
Três meses depois Tereza determinou a seu marido que voltaria. Ele recusava-se. Ela garantiu-lhe que ele ficaria só, pois, nem ela nem os outros filhos suportavam mais aquele lugar. Muito contrariado ele resolveu concordar. Seu cunhado aconselhou seu marido a ficar, mesmo sem a esposa, pedindo que os deixasse partir sem ele, mas Vicente não concordou.
Novamente venderam o que puderam, até uns poucos animais, que haviam adquirido, e a louça voltou, outra vez, em uma caixa de papelão. Era final de 1979. Na volta passaram em Petrolina, ficaram em casa de minha mãe, Laura, e lá romperam o ano novo e passaram mais alguns dias do mês de janeiro de 1980, onde resolveram empreender viagem de volta ao Rio Grande do Norte.
Seu esposo não desanuviava o semblante, mantinha a face crispada pela raiva de ter que voltar maltratando-a no regresso quando se recusava pagar-lhe a comida. Ela chegou a admitir que passou fome nessa viagem.
Chegando a Souza, na Paraíba, a família resolveu dormir na estação de trem, onde pegaria esse meio de transporte tão popular naquela região, rumo ao interior do Rio Grande do Norte. Todavia, um determinado funcionário recusou deixá-los repousar na estação, contudo, os deixaria pernoitar até dentro do trem, se lhe pagassem “uns trocados”. O trem já estava na estação esperando o horário de partir, eu mesma havia pegado esse mesmo trem rumo a Mossoró na década de “oitenta”. Era romântico e saborosamente nostálgico.
Assim foi feito. Tereza estendeu duas redes para os meninos, em meio à penumbra do vagão, enquanto em baixo os adultos deitavam-se nos bancos de madeira. Mais tarde descobriram que um casal de idosos já dormia na parte traseira dos bancos. O tal funcionário queria mesmo era ganhar uns trocados. Lá pelas tantas, durante a madrugada, foram acordados com a briga feia do senhor idoso, que disse, em alto e bom som, ter sido urinado pela própria esposa que molhou o “leito” em que dormiam.
Só aí o esposo de minha tia desarmou-se, juntos tiveram uma crise de riso, tanto, que quase se urinaram também.
Logo cedo foram acertar com o tal funcionário que reclamou muito quanto ao valor recebido, pois aquela quantia não dava sequer para comprar, nas palavras dele, um “quilo” de tripa. “Ora, ‘um quilo de tripa’, falou Tereza, e completou: só nós pobres mesmos... Pior se as tais “tripas” resultaram em um copo de pinga...”. Rimos a valer enquanto ouvia sua narrativa.
Ao retornar foram para o Sítio Poço, de Abel Feitosa. Plantavam como meeiros, lá ficaram dois anos. Nesse meio tempo chegaram a possuir um “pedacinho de terra”, como costumavam falar.
Um dos filhos, Silas, resolveu vir morar em Petrolina, com minha família, e observando a rotina de meu pai, possuidor de um Lote, agrícola, de irrigação no Projeto Maniçoba, interior de Juazeiro-BA, esse filho resolveu convidá-los para vir morar nessa região.
O filho mais velho, “Hominho”, veio primeiro e trabalhou na diária com meu pai, e se deparou com a possibilidade de adquirirem um Lote através de compra. Foi comunicado todos os detalhes como preço, tipo de cultura apropriado ao plantio, localização, quantidade de hectares, etc. E assim realizaram a compra.
Outra vez venderam os poucos pertences, incluindo a pequena terra, algumas criações e vieram de mudança em dezembro de 1984, com eles, a velha caixa de papelão contendo a “louça”. Foi um tempo de luta, mas também de vitória, de felicidade, pois agora sentiam-se donos daquele “torrão”.
As duas famílias eram muito unidas, assim como era Tereza com sua irmã caçula, Laura. As duas ajudavam-se mutuamente dividindo quase tudo.
No entanto Tereza sentiria três grandes dores, que foi para ela três grandes perdas. Primeiro perdeu o marido, Vicente Batista, que falecera durante uma cirurgia para a retirada de um tumor no estômago, ele era meio bruto, mas não deixava de ser um companheiro. Tereza nunca suportou a solidão, sempre gostou de ter pessoas ao seu redor, afirmava isso sempre. Algum tempo depois sofreu a perda de seu neto de 23 anos, fora assassinado. Anos depois perdeu a irmã mais nova, minha mãe, essa perda foi, segundo ela mesma, a maior de todas, tamanha a simbiose que havia entre ambas.
Parte da família do esposo de Tereza era considerada um tanto amaldiçoada. Segundo consta, a mãe de Vicente já amaldiçoava os filhos desde pequenos quando os cobria de nomes demoníacos: “seu Satanás”, “sua Besta-fera!”. Era assim que tratava os filhos. O resultado dessas maldição, se é que isso é possível, foi o suicídio de alguns.
Primeiro morreu a mãe de Vicente Batista, de morte natural. José Batista, o pai, esclerosado, corria nas estradas, ia para os sítios vizinhos, proferia xingamentos às pessoas com os mais terríveis palavrões satânicos, enquanto evocava o Diabo. Morreu em um manicômio.
Os irmãos de Vicente, Francisco Alves Batista, chamado “Chico Batista”, filho mais velho de seus pais, morreu enforcado, era uma pessoa calma. Teve dois filhos, nunca casou, morreu com aproximadamente 30 anos. Ninguém descobriu o motivo de seu suicídio. Colocou parte de uma corda no armador de rede, outra parte em volta do pescoço e pendurou-se, isso em 1956, nas Piranhas.
Raimundo Alves Batista, casado, 10 filhos, enforcou-se na casa dele. Os filhos o vigiavam constantemente, mas em um descuido ele cometeu o ato.
Benedito Alves Batista vivia como um andarilho. Por onde ia carregava os seus “bens” que cabiam em um saco, apesar de ser aposentado. Era uma pessoa muito ingrata e agressiva, até para com aqueles que lhe davam ajuda. Foi assassinado a pauladas em Mossoró, RN.
Raimunda Batista, filha caçula, morava em Apodi, RN, tinha depressão. Certo dia, pela manhã, ela seria levada ao médico, todos achavam que ela estava arrumando-se com esse fim, enquanto os demais tomavam café. Em poucos minutos ouviu-se um tiro. Raimunda Batista se matara com um disparo no ouvido, ela havia passado por dois casamentos e tinha seis filhos.
Lair Batista, neto de José Batista, em 2010 perdeu um filho, acidente de moto. Em 2011, ele perdeu a esposa de um ataque cardíaco fulminante. Em outubro de 2012, Lair, não resistindo a dor de tantas perdas, lamentavelmente, seguiu a mesma fatalidade da família. Estava bastante deprimido. Pegou uma corda e falou que ia a busca de determinado animal, a família acreditou. O que todos não imaginavam é que Lair fosse para o quarto pendurar-se na referida corda e lá morreu.
Passado o tempo de sua viuvez, Tereza resolveu mudar-se para Petrolina, PE, onde aí comprou uma boa casa e morou em um bairro próximo do meu, em companhia de dois de seus filhos, Elídia e Edson.
Tereza era evangélica da Assembleia de Deus. Ela se encontrava com 84 anos (2019), quando me contou sua história. Era dona de uma mente muito lúcida, pena que a artrose nos joelhos, que a fazia usar bengala e com passadas retesadas a deixava um tanto deprimida, não bastasse a luta travada com o filho Edson, de quase cinquenta anos, com depressão crônica e alterações de comportamento, por vezes.
Minha tia Tereza amava receber visitas. Ela dizia que eu era a que mais a visitava. Por volta das 18h, ou mais, eu gostava de encontrá-la em sua casa, vez ou outra. Ela punha a cadeira na calçada e nós conversávamos. Muitas vezes desabafou comigo, em algumas situações, com lágrimas, me fazia confidência. Nos últimos dias, contudo, ela estava bem doente, embora lúcida. Muitas foram as consultas e os medicamentos, porém, sem muito resultado. Ela ficava o tempo todo deitada.
No dia dez de maio de 2022, por voltas das 9h da manhã, eu havia me levantado, tomado café quando minha prima Elídia me ligou desesperada. Tia estava bem mal, suas mãos estavam arroxeando, ela estava cianótica. Minha prima ligou para o irmão dela mas ele estava preso no trânsito.
Eu peguei minha costumeira moto e corri para lá. Meu primo chegou quase que ao mesmo tempo. Colocamos ela no carro, ela fez alguns comentários e rumamos para a UPA. No caminho tudo conspirava para a lentidão do veículo, um caminhão à nossa frente, outro carro que não dava passagem. Em dado momento ela inclinou-se para o lado. Eu e a esposa do neto dela estávamos sentadas no banco traseiro. Eu a sacudi levemente, e a chamei. Não houve resposta. Por um instante me bateu um leve desespero.
- Silas, tia morreu! Falei, elevando a voz. Ele respondeu que não, e passou a chamá-la também. Não houve resposta. "Pelo amor de Deus, acelere esse carro". Reforcei.
Ao chegarmos na UPA os enfermeiros vieram com a cadeira de rodas. Minutos depois recebemos a notícia de que minha tia estava morta. Sua neta, médica, foi chamada e agilizou toda a burocracia.
Essa tia era para mim, uma das segundas mães, juntamente com minha tia Maria. Tenho-lhe muito amor e consideração. Fiquei muito triste e tenho muitas saudades.
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